Israelense se
disfarça de palestina e relata experiência
A israelense Liad Kantorowicz,
de 30 anos, ativista política formada em estudos do Oriente Médio,
resolveu usar a si mesma como cobaia de um experimento sociológico:
durante um mês ela circulou em Tel Aviv disfarçada de palestina
muçulmana.
Seu objetivo era verificar quais
seriam as reações de israelenses, habitantes de Tel Aviv, a uma
mulher palestina que estivese circulando em diversos lugares da
cidade normalmente freqüentados apenas por israelenses.
Liad, que relatou a experiência no
semanário Ha'ir, de Tel Aviv, disse que foi objeto de várias reações
hostis-- e que ficou surpresa com a intolerância que encontrou na
cidade onde vive.
Durante um mês, Liad saiu de casa
todos os dias com a cabeça coberta por um hijab - um lenço que cobre
os cabelos e o pescoço, usado freqüentemente por palestinas
muçulmanas - e se vestiu de forma "a combinar com o hijab", ou seja,
com roupas bastante conservadoras, segundo as tradições palestinas.
"Meu plano era continuar vivendo a
minha vida normal e freqüentar os mesmos lugares que costumo
freqüentar, mas usando o hijab, e registrar as reações das pessoas",
disse Liad à BBC Brasil.
"Também queria tentar sentir o que
sente uma mulher palestina que circula em Tel Aviv".
Liad imaginava que fosse enfrentar
manifestações de racismo. Mas ela conta que ficou chocada com a
intensidade das reações negativas.
Disfarce
Durante a experiência, ela circulou
nas ruas da cidade, foi ao banco e ao supermercado, almoçou em
restaurantes e freqüentou bares e clubes noturnos.
Chegou até a publicar um anúncio na
internet, oferecendo um quarto para alugar e recebeu inquilinas
potenciais em seu apartamento, sempre vestindo o hijab.
"Uma mulher me telefonou. Conversamos
um pouco por telefone, ela ouviu meu sotaque israelense típico e
combinamos que viria ver o apartamento".
"Abri a porta usando o hijab e
percebi que ela levou um susto".
Segundo Liad, a mulher desistiu de
alugar o quarto alegando que "não era racista, mas seria difícil
morar com alguem tão diferente".
"Ela quase teve um ataque de histeria
e não parava de dizer que não era racista".
A israelense conta que a potencial
inquilina voltou a contactá-la dias depois, afirmando que estaria
disposta a alugar o quarto se ela deixasse de usar o hijab e
retirasse os cartazes em árabe que ela tinha pendurados nas paredes
do apartamento.
Em outra ocasião, Liad combinou um
encontro em um restaurante com um amigo, soldado, que chegou vestido
com seu uniforme militar.
"Foi um momento bem cômico, nosso
encontro causou a maior confusão no restaurante, todas as pessoas
pararam de comer quando trocamos beijos e abraços", relatou Liad.
Olhares
Para ela, uma das coisas mais
difíceis era andar na rua.
"Sentia que todos os olhares se
concentravam em mim, e havia muitos olhares hostis".
Em algumas ocasiões ela conta que
chegou a sofrer violência física.
Quando participou em uma manifestação
de grupos de esquerda contra o bloqueio de Israel à faixa de Gaza,
ela diz ter sido agredida por pessoas que passavam na rua.
"Éramos cerca de cem manifestantes,
mas eu fui a única que sofreu agressões fisicas, algumas pessoas me
empurraram, cuspiram em mim e gritaram 'desapareça deste país, não
queremos vê-la por aqui!'."
Boate
De acordo com Liad, o momento mais
doloroso da experiência ocorreu em uma boate gay.
"Dava para cortar o ar de tanta
tensão, todos os olhares se voltaram para mim quando entrei na
boate, que supostamente deve ser um lugar de tolerância".
Liad diz ter sentido olhares hostis,
que claramente diziam que ela não era bem-vinda e dois homens jovens
chegaram a agredí-la verbalmente, gritando: "como você ousa usar o
símbolo do islã neste lugar impuro?".
Segundo ela, eram dois gays
palestinos, que se faziam passar por israelenses, que quase a
agrediram fisicamente.
"Eu os levei para fora (da boate) e
expliquei o objetivo da minha experiência. Um deles começou a
chorar, acho que o fiz perceber a contradição em que vivia".
Experiência
Embora tenha passado por momentos
dificeis, Liad não se arrepende da experiência.
"Foi fascinante", disse, "aprendi
muito durante este mês".
"Com o hijab e as roupas que vesti,
estava coberta da cabeça aos pés, mas me senti mais exposta do que
nunca a todos os tipos de violência" disse Liad.
"A experiência me fez perceber o
quanto eu não sei sobre as mulheres palestinas", afirmou a jovem.
"Tentei entrar em um personagem imaginário, mas não posso saber
realmente como uma mulher palestina se sente".
Fonte:
folha.uol.com.br
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