Governo de Bush
admite tortura em Guantánamo
Um oficial de cúpula do governo
do presidente americano, George W. Bush, admitiu em uma entrevista
publicada nesta quarta-feira no jornal "Washington Post" que o
saudita Mohammed al Qahtani, acusado de envolvimento nos ataques de
11 de Setembro, foi torturado na prisão da base de Guantánamo, em
Cuba --onde continua preso. "O tratamento dado a ele encaixa nas
definições legais de tortura", afirmou Susan J. Crawford.
Conforme o jornal,
Crawford, 61, é uma juíza aposentada que serviu como conselheira
geral do Exército no governo de Ronald Reagan (1981-1989) e como uma
inspetora do Pentágono quando o atual vice-presidente, Dick Cheney,
era secretário de Defesa de Bush (1989-1993). Em fevereiro do ano
passado, Crawford foi designada por Cheney para decidir quais presos
de Guantánamo devem ser julgados.
Com a entrevista, Crawford torna-se a
primeira oficial de cúpula da administração Bush --que termina em
menos de uma semana, no próximo dia 20-- responsável por revisar
práticas de Guantánamo a admitir publicamente a ocorrência de
tortura. "As técnicas usadas eram todas autorizadas, mas a maneira
como elas foram aplicadas foi muito agressiva e persistente."
Bush e Cheney negam que suas
"técnicas" possam ser classificadas como torturas.
"Quando você pensa em tortura, pensa
em atos físicos terríveis praticados contra alguém. Mas não houve um
ato específico. Foi uma combinação de coisas que tiveram um impacto
médico sobre ele, que prejudicaram sua saúde. Foi abusivo e
desnecessário. E coercitivo. Claramente coercitivo."
Qahtani teve sua entrada nos EUA
negada um mês antes do 11 de Setembro. Mais tarde, ele foi preso no
Afeganistão e, em janeiro de 2002, enviado a Guantánamo. Os
interrogatórios de Qahtani duraram mais de 50 dias, entre novembro
de 2002 e janeiro de 2003. Depois disso, o saudita ficou isolado até
abril de 2003. "Por 160 dias, o único contato foi em
interrogatórios."
"Em 54 dias, ele foi interrogado em
48 dias consecutivos, durante 18 horas a 20 horas. Ele foi colocado
nu diante de uma agente feminina. Foi submetido a revistas íntimas.
Teve a mãe e a irmã insultadas", ressalta a agente do governo
americano. Crawford conta ainda que Qahtani foi "obrigado a usar
sutiã e a colocar uma calcinha na cabeça, nos interrogatórios".
Com uma coleira presa às correntes, o
prisioneiro foi arrastado pela sala de interrogatórios e forçado a
"imitar truques de cachorros".
"Os interrogatórios foram tão
intensos que Qahtani precisou ser hospitalizado duas vezes em
Guantánamo com braquicardia, uma situação na qual a frequência
cardíaca fica abaixo de 60 por minuto e que, em casos extremos, pode
levar à falência cardíaca e à morte", diz o "WP".
Crawford, embora admita a tortura,
diz acreditar que o saudita participaria dos atentados, se não
tivesse tido o visto para os EUA recusado. "Ele é um homem perigoso.
E o que faremos, senão acusá-lo e julgá-lo? Eu hesitaria em dizer
'soltem-no'." Essa decisão sobre o futuro do saudita caberá, a
partir do próximo dia 20, ao presidente eleito, Barack Obama. Obama
já afirmou que, uma vez empossado, seu primeiro ato será ordenar o
fechamento de Guantánamo.
Em maio do ano passado, Crawford
ordenou que as acusações de crimes de guerra feitas a Qahtani fossem
retiradas.
"Eu estava chocada. Estava triste.
Estava envergonhada. Se tolerarmos e permitirmos isso, então como
poderemos reclamar quando nossos homens e mulheres, e outros no
exterior, foram capturados e submetidos às mesmas técnicas? Onde
estará nossa autoridade moral para reclamar? Bom, talvez a tenhamos
perdido."
Fonte:
folha.uol.com.br
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