Por falar em euforia, o que não falta
são novos e velhos conjuntos residenciais, prédios e condomínios em
toda parte, até na velha e boa Mooca, onde moro prazerosamente há
mais de dez anos. Isso me fez lembrar do saudoso Zé Rodrix e sua
adaptação musical em parceria com Sá e Guarabyra de uma frase
bíblica: "Ama teu vizinho como a ti mesmo/mesmo que ele faça
barulho/mesmo que ele acorde as crianças de madrugada/ele também
gosta de silêncio e paz/ele também quer sossego/mas acontece que ele
vive num horário diferente do teu". Poderíamos acrescentar: mesmo
que ele seja canino, teu vizinho pode ter e dar sossego - e o dono
pode aprender a ajudá-lo.
Um canino de apartamento ter sossego
significa viver bem, mesmo morando na "gaveta" mais apertada (ou,
para citar o sambista Germano Mathias, pode ser aquelas quitinetes
que ele chama só de "apartamen", o "to" nem cabe).
Com todo o respeito a Sá, Rodrix &
Guarabyra, dar sossego significa o amado vizinho peludo, mesmo
vivendo em horário diferente dos outros, saber respeitar o horário
alheio, sem "fazer barulho", "acordar as crianças de madrugada" e
outros detalhes que vamos lembrar agora.
O bem-estar do canino...
Embora raças caninas de pequeno porte sejam famosas como "cães de
apartamento", até raças enormes, como o Akita, podem viver muito
bem, mesmo "engavetados" - desde que não fiquem enfiados na "gaveta"
o tempo todo. Quem vive bem em gaiola é passarinho, e ainda assim a
gaiola é grande proporcionalmente ao tamanho do bicho.
Seja qual for a raça, porte ou idade
do peludo, ele precisa de, no mínimo, um passeio diário; quanto mais
ele se espalhar em pátios, quintais ou praças, melhor - ainda mais
se o apartamento for realmente pequeno e a área de serviço for do
tamanho de uma unha, apropriado só para o aconchego da hora de
dormir. Afinal, como diz a canção, uma casa não é um lar, e para um
canino doméstico o mais importante não é a casa, e sim a(s)
pessoa(s) que mora(m) com ele.
Melhor viver num "apertamento" com um
dono ou dona presente que abandonado numa mansão. Tudo tem seu lado
bom: sem a comodidade de um quintal grande, o peludo de apartamento
sai à rua para estirar a musculatura e ganha mais oportunidades para
conhecer novos ambientes, ares, pessoas e brincadeiras.
Como relata o estadunidense Stacey
Midge: "Quando nos mudamos de uma grande casa no campo para um
apartamento pequeno na cidade, minha cadela passou por um período
significativo de ajustes. Ela não estava acostumada com o barulho e
o tráfego da cidade, e ela descontou a ansiedade no meu tapete! Mas
com o tempo ela se adaptou às mudanças de espaço e sons - talvez bem
mais rapidamente do que se ela tivesse sido dada a uma nova família
caso eu tivesse achado que não poderia mantê-la nestas condições. Os
sacrifícios de tempo e limpador de tapete valeram muito a pena para
nós dois."
Por falar em dono(a) presente - e eu
sei que é teu caso - , é preciso estar atento: caninos de grande
porte ou em fase de crescimento estão sujeitos a displasias, ou
seja, má formação nas articulações que podem causar até atrofias
musculares.
Exercício moderado é um dos melhores
tratamentos para displasias (além de evitar que o peludo enfrente
pisos escorregadios). Mais um motivo, portanto, para o canino dar
uma de Gonzagão, ou seja, descansar em casa e morar no mundo.
De tão óbvio, é sempre bom lembrar:
pelo menos uma vez por dia limpe o cocô e xixi dos peludos, além de
varrer os pêlos que eles adoram deixar por aí de vez em quando.
...e o bem-estar dos
vizinhos
Tanta gente tem reclamado de cães em condomínios que surgiu a lenda
de que aqueles estão, pura e simplesmente, proibidos de viver
nestes. Na verdade, o que a lei (nada menos que a Constituição
Federal, desde 1988) proíbe é o mau trato aos animais e qualquer ato
que comprometa o bem estar dos vizinhos. (Sem falar que não falta
gente que, como Cyro Aguiar canta, "só se realiza quando abre a boca
para reclamar", seja de cães, de crianças, de música, de silêncio,
do calor, do frio, da Lua ou do Sol.) Mais detalhes sobre a
legislação para bichos em condomínios
aqui.
De modo que o canino não só pode
residir numa boa com seu dono em condomínio, como também deve ser
educado para não latir fora de hora (ainda falaremos sobre isso),
não fazer suas necessidades em locais indevidos (idem), muito menos
atacar quem mal acabou de conhecer (sobre isso já falamos).
A lei assegura ao cidadão o direito
de viver em seu apartamento com mais de um cão - desde que dentro do
bom senso em termos de comodidade e asseio para todos, cuidando
inclusive de banho, tosa e vermifugação regulares e da medicação
acaso necessária. (Lembrei-me de um saudoso primo de minha mãe que
mantinha em seu apartamento quatro cães de pequeno porte, incluindo
um Chihuahua que confirmava a reputação de ferocidade normalmente
dada aos pobres Pitbulls.)Você já deve ter se lembrado daquelas duas
ilustres palavrinhas feitas uma para a outra: "posse responsável". O
cão só deve andar de coleira e focinheira pelas dependências comuns
do condomínio se for feroz e de grande porte. Sim, qualquer canino
pode e deve usar o elevador (mas somente o de serviço),
especialmente se tiver algum problema de saúde e/ou estiver idoso.
Obviamente, o canino, bravio ou não,
deve estar sempre limpo, o que beneficia não só o ambiente, mas
também a ele próprio. Não se esqueça de limpar toda a sujeira que o
cão fizer, nem de assumir os danos que ele acaso causar. Inclusive,
como já lembramos e noutra ocasião iremos comentar melhor, eduque-o
para não latir sem motivo das dez horas da noite às seis da manhã.
Não seja um condômino dono de bicho
antissocial ou alienado, daqueles que só põem a culpa no governo,
mas não fazem a parte que lhes compete.
Participe regular e ativamente das
reuniões e assembleias, não deixando que decidam nada - inclusive
coisas ilegais como proibição sumária da presença de animais
domésticos - sem seu conhecimento. Aos mais implicantes, mostre as
carteiras de vacinação em dia e argumente que os condôminos peludos
podem até contribuir para a segurança do lugar - inclusive
diminuindo a carga de trabalho do zelador!
Ótimo lembrador que sou, e ainda em
clima de ano novo, penso ser oportuno lembrar de meu "Reveião do
Milênio", que passei em Búzios com uma trinca de gatinhos
recém-nascidos órfãos de pai e mãe, e que precisei levar comigo de
São Paulo.
Obviamente, condomínios não podem
proibir bichos de estimação, mas pousadas e hotéis reservam-se esse
direito. Como sempre digo, verifique se aceitam hóspedes
consideravelmente mais peludos que Tony Ramos. Antes de viajar,
telefonei para a pousada que aluguei e expliquei a situação.
Responderam "Ahn... tudo bem, mas o senhor é o responsável." No fim,
adivinhem: tive de "lutar" contra o pessoal da pousada, que queria
os gatinhos de presente...