"Iara Lee está em boas condições de
saúde e recusou a opção de deixar o país voluntariamente. Neste
momento está com as autoridades israelenses aguardando ser
deportada."
Segundo a embaixada de Israel, o
Itamaraty já foi informado pelo embaixador de Israel, Giora Becher.
O Exército de Israel atacou na
madrugada desta segunda-feira um comboio de barcos organizado pela
ONG Free Gaza, um grupo de seis navios, liderados por uma embarcação
turca, que transportava mais de 750 pessoas e 10 mil toneladas de
ajuda humanitária para a faixa de Gaza, deixando ao menos dez mortos
e cerca de 30 feridos.
A cineasta brasileira Iara Lee estava
a bordo de um dos barcos atacados na manhã desta segunda-feira por
Israel, segundo a Folha apurou.
Iara Lee
O último contato feito por Iara tinha
sido na noite de ontem, quando, segundo amigas, ela postou mensagem
no site de relacionamentos Facebook anunciando que o barco em que
ela estava fora cercado pela Marinha de Israel. A brasileira
embarcou na última quinta-feira a partir da Turquia e vinha dando
notícias graças a uma conexão internet disponível no barco em que
ela estava.
Em carta escrita antes do embarque,
Iara justificou a participação na missão a Gaza dizendo que
pretendia chamar atenção para o que ela considera "grave abuso de
direitos humanos" cometidos por Israel contra a faixa de Gaza.
"Normalmente eu consideraria uma
missão de boa vontade como esta completamente inócua. Mas agora
estamos diante de uma crise que afeta os cidadãos palestinos criada
pela política internacional. É resultado da atitude de Israel de
cercar Gaza em pleno desafio à lei internacional. Embora o
presidente Lula tenha tomado algumas medidas para promover a paz no
Oriente Médio, mais ação civil é necessária para sensibilizar as
pessoas sobre o grave abuso de direitos humanos em Gaza", diz a
carta de Iara.
"[...] Eu me envolvo porque creio que
ações resolutamente não violentas, que chamam atenção ao bloqueio,
são indispensáveis esclarecer o público sobre o que está de fato
ocorrendo. Simplesmente não há justificativa para impedir que cargas
de ajuda humanitária alcancem um povo em crise", acrescenta o texto.
Além de militar pela paz e pelo
diálogo entre culturas, Iara Lee é uma produtora e cineasta
brasileira de ascendência coreana radicada nos EUA. Entre suas obras
estão os documentários "Synthetic Pleasures" (1995), que trata do
impacto da alta tecnologia sobre a cultura de massas, e "Modulations"
(1998), considerada uma das obras cinematográficas mais importantes
sobre música eletrônica.
Iara é divorciada e não tem filhos.
Reunião
O embaixador israelense encontrou-se
nesta segunda-feira com a Subsecretária-Geral de Assuntos Políticos
do Itamaraty, embaixadora Vera Lúcia Barrouin Crivano Machado, às 17
horas, no Itamaraty, após ser convocado.
O embaixador de Israel reafirmou a
posição israelense de que a flotilha não seguia com uma ação
humanitária, mas chegou como uma provocação com o intuito de apoiar
o regime ilegal e terrorista do Hamas em Gaza.
O Embaixador manifestou ainda que não
existe crise humanitária em Gaza, uma vez que todo o tipo de ajuda
tem ingressado diariamente na região. Israel ofereceu aos
organizadores da flotilha a alternativa de seguirem para o porto de
Ashdod, onde os suprimentos de ajuda humanitária seguiriam para Gaza
por via terrestre. Os organizadores não aceitaram esta opção.
"Foi mencionado ainda, pelo
embaixador, que os soldados israelenses embarcaram sem empunhar suas
armas e foram atacados violentamente, com ameaças às suas vidas,
pelos manifestantes que não foram pacifistas. Somente após sofrerem
os violentos ataques, os soldados israelenses reagiram em legítima
defesa", informa a embaixada israelense em seu comunicado.
Versão de Israel
O ministério das Relações Exteriores
de Israel compilou uma nota tentando justificar o ataque do Exército
israelense contra a "Frota da Liberdade" na madrugada desta
segunda-feira (31). Traduzido para várias línguas e divulgado pelas
embaixadas israelenses ao redor do mundo, o documento visa conter a
rejeição da comunidade internacional ao ataque, julgado como
"desproporcional".
Segundo a nota o chanceler
israelense, Avigdor Lieberman, "os membros da embarcação não estavam
em missão de paz e são, na verdade, terroristas que atacaram os
militares das FDI [Forças de Defesa de Israel] quando estes
abordaram a embarcação que se dirigia à faixa de Gaza".
Ainda de acordo com o comunicado, as
tropas israelenses teriam tentado "dialogar e alcançar um
entendimento com os organizadores da frota.
O comunicado lembra ainda que "todas
as solicitações de Israel ao Hamas para que fosse autorizada a
entrada da Cruz Vermelha na faixa de Gaza, com o fim de visitar e
atender o soldado israelense sequestrado, Gilad Shalit, foram
negadas".
Para o governo israelense a tentativa
do comboio humanitário de furar o bloqueio à faixa de Gaza e
entregar suprimentos à região foi uma "violência pré-planejada pelo
grupo que atacou as FDI e Israel não permitirá qualquer ofensiva ao
seu Estado por parte de grupos terroristas ou seus apoiadores".
Reação brasileira
O chanceler Celso Amorim afirmou
nesta segunda-feira que o ataque israelense à flotilha que levava
ajuda humanitária à faixa de Gaza justifica a tomada uma ação por
parte da ONU. "É um ato muito grave, estamos preocupados com isso,
esperamos que a ONU adote alguma ação, e que Israel possa atender ao
que for solicitado", disse.
O governo brasileiro condenou nesta
segunda-feira, em nota oficial, o ataque. A nota indica que o
governo convocou o embaixador de Israel ao Itamaraty para que seja
"manifestada a indignação do governo brasileiro com o incidente e a
preocupação com a situação da cidadã brasileira".
"O Brasil condena, em termos
veementes, a ação israelense, uma vez que não há justificativa para
intervenção militar em comboio pacífico, de caráter estritamente
humanitário. O fato é agravado por ter ocorrido, segundo as
informações disponíveis, em águas internacionais. O Brasil considera
que o incidente deva ser objeto de investigação independente, que
esclareça plenamente os fatos à luz do Direito Humanitário e do
Direito Internacional como um todo", diz o governo brasileiro no
comunicado.
Outros países
O presidente da Autoridade Nacional
Palestina (ANP), Mahmoud Abbas, decretou três dias de luto nos
territórios palestinos devido ao ataque israelense à "Frota da
Liberdade". Em comunicado emitido na cidade cisjordaniana de
Ramallah através da agência oficial palestina "Wafa", Abbas não
anunciou, no entanto, uma interrupção do diálogo indireto de paz que
mantém com Israel.
Em visita ao Chile, o premiê turco,
Recep Tayyip Erdogan, disse nesta segunda-feira que Israel cometeu
um ato de "terrorismo de Estado, "demonstrou que não quer a paz na
região" e "violou a lei internacional".
O ministro de Defesa do Irã fez nesta
segunda-feira um apelo à comunidade internacional para que cortem
todas as relações com Israel após a morte de ativistas que levavam
ajuda humanitária à faixa de Gaza a bordo de navios nesta
segunda-feira.
Os Estados Unidos lamentaram a ação e
indicaram que uma investigação deve apurar os detalhes da ação
militar.
A Rússia considera que o ataque das
tropas israelenses contra uma frota pró-palestina que levava ajuda
humanitária à faixa de Gaza constitui uma "grosseira violação do
direito internacional", segundo comunicado oficial divulgado nesta
segunda-feira.